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Starbucks usa nostalgia para reconquistar
Retomada no Brasil de Starbucks, aposta em marketing emocional
13/06/2025, 14:05
A pergunta que ecoa nas mentes de quem passou por uma cafeteria fechada da Starbucks nos últimos meses é quase dolorosa: "Quantos cafés você já não tomou aqui?". Essa é exatamente a provocação que a marca escolheu para seu retorno ao mercado publicitário brasileiro, depois de um período turbulento que resultou no fechamento de mais de 50 lojas.
A Starbucks no Brasil representa muito mais que uma simples volta ao mercado. É uma aposta arriscada em memórias afetivas e no poder da nostalgia para reconectar consumidores.
A crise que quase acabou com a Starbucks no Brasil
Para entender a magnitude da campanha Retomar, é preciso conhecer os bastidores da crise que quase levou a marca ao fim no país. A SouthRock Capital, operadora da Starbucks desde 2018, enfrentou dificuldades financeiras severas durante e após a pandemia.
Em 2020, a empresa viu suas vendas despencarem 95%, seguidas por quedas de 70% em 2021 e 30% em 2022. O resultado foi devastador: mais de 50 lojas fechadas em dois anos e uma dívida estimada em R$ 1,8 bilhão.
A situação se agravou quando a matriz americana da Starbucks rescindiu a licença da SouthRock em outubro de 2023, por falta de pagamento de royalties. Em dezembro do mesmo ano, a SouthRock entrou oficialmente em recuperação judicial.
Zamp assume e planeja a retomada da marca
A salvação veio através da Zamp, holding que controla Burger King e Popeyes no Brasil. Em junho de 2024, a empresa finalizou a compra das operações da Starbucks por R$ 120 milhões, assumindo o controle de aproximadamente 130 lojas restantes.
Leonardo Yamamoto, da Mubadala Capital (controladora da Zamp), foi direto ao ponto: "A Starbucks é uma marca incrível, estava no meio de uma confusão". O fundo árabe vê oportunidade na crise do setor alimentício brasileiro.
Apostando no marketing emocional
A Starbucks retomada no Brasil ganhou forma através da campanha "Retomar", criada pela AlmapBBDO. A estratégia é ousada: em vez de ignorar o passado recente, a marca abraça a narrativa de ausência e retorno.
O filme publicitário lista momentos marcantes que aconteceram nas lojas: Jéssica e Cam reatando amizade com cappuccino, Alê decidindo abrir negócio próprio com um mocha, João mandando "aquela mensagem" tomando cold brew. A locução é clara: "Retomar não é só voltar, é tomar de novo com mais vontade, mais história, mais significado".
Por que o marketing de nostalgia funciona
O marketing de nostalgia tem ganhado força porque nosso cérebro processa lembranças de forma positiva, trazendo sensações de felicidade e segurança. Quando uma marca desperta essas emoções, cria uma relação de proximidade e fidelidade.
Exemplos brasileiros recentes mostram o poder dessa estratégia: os chocolates da Turma da Mônica faturaram R$ 5 milhões em dois meses. A Starbucks aposta que sua presença em momentos importantes da vida dos consumidores pode gerar o mesmo efeito.
Os desafios da volta ao mercado brasileiro
A Starbucks no Brasil enfrenta obstáculos significativos. Durante a ausência da marca, o mercado de café especial brasileiro cresceu exponencialmente. Pequenas torrefações, marcas autorais e microlotes conquistaram consumidores que buscam "café de verdade".
O brasileiro desenvolveu uma nova relação com o café, que deixou de ser apenas bebida para virar experiência, lifestyle e cultura. Hoje, café é sobre ritual, origem, curadoria e história.
A questão do preço
Um dos maiores desafios é justificar preços que podem chegar a R$ 20 por um café. O cardápio atual mostra valores entre R$ 17 e R$ 27 para bebidas de diferentes tamanhos. Com o mercado mais competitivo e exigente, a marca precisa entregar valor que justifique o investimento.
Planos de expansão para 2025
A Zamp tem planos ambiciosos para a Starbucks no Brasil. A empresa pretende voltar a expandir a rede em 2025, revertendo o cenário de fechamentos. Há até especulações sobre uma expansão agressiva que poderia levar a marca a 1.000 lojas no país.
O foco estará nas grandes cidades e seus aeroportos, incluindo Rio de Janeiro e São Paulo, onde se espera maior demanda. A estratégia considerará diferentes tamanhos de loja para otimizar custos e alcançar mais públicos.
Melhorias na experiência do cliente
A retomada também se alinha com mudanças globais na Starbucks. O CEO mundial Brian Niccol conduz uma reestruturação focada em cardápio simplificado e melhor experiência nas lojas. Essa abordagem pode ser fundamental para reconquistar consumidores brasileiros.
A nostalgia será suficiente para o sucesso?
A pergunta que permanece é se a memória afetiva conseguirá fazer o consumidor voltar a pagar valores premium por café. A resposta dependerá não apenas da força da marca e de sua publicidade, mas da execução no ponto de venda.
Atendimento, ambiente, consistência e qualidade serão cruciais para que o reencontro com o consumidor seja realmente um novo começo. A marca precisará provar que aprendeu com os erros do passado e está pronta para oferecer valor real.
Lições para outras marcas
A Starbucks no Brasil oferece aprendizados valiosos sobre gestão de crise e marketing emocional. A estratégia de assumir os erros do passado e transformá-los em narrativa de recomeço pode inspirar outras empresas que enfrentam desafios similares.
O sucesso ou fracasso dessa abordagem será um case study importante para o mercado brasileiro, especialmente em um momento onde consumidores valorizam autenticidade e transparência das marcas.
A campanha "Retomar" representa uma aposta corajosa de que, às vezes, olhar para trás pode ser o caminho para seguir em frente. Resta saber se os brasileiros estão dispostos a dar uma nova chance para quem admite ter errado e promete fazer melhor.