Tecnologia
Nem máquina de lavar escapa das mãos de hackers
Hackers comprometem sistema de pagamento de máquinas inteligentes em universidade holandesa causando caos
15/09/2025, 11:30
Quando pensamos em ataques cibernéticos, normalmente vem à mente invasões a bancos, roubo de dados pessoais ou sequestros digitais de grandes empresas. Raramente consideramos que algo tão básico quanto lavar roupas pode se tornar vítima de criminosos virtuais. Contudo, foi exatamente isso que aconteceu com cerca de 1.250 estudantes da Universidade de Amsterdã, no campus Spinoza, que se viram em uma situação inusitada: sem acesso a serviços de lavanderia devido a um ataque hacker a máquinas de lavar.
Como o ataque transformou benefício em problema
O ataque hacker a máquinas de lavar começou de forma quase benéfica para os estudantes. Um invasor conseguiu comprometer o sistema de pagamento digital das cinco máquinas inteligentes do campus em julho de 2025. Inicialmente, essa invasão permitiu que os alunos lavassem suas roupas gratuitamente, já que o mecanismo de cobrança havia sido desativado.
Durante algumas semanas, a empresa de gestão do campus, Duwo, manteve o serviço funcionando mesmo sem receber pagamentos. Contudo, a situação se tornou insustentável do ponto de vista financeiro. A administração decidiu fechar completamente a lavanderia após perceber que não conseguiria arcar com os custos operacionais sem a receita dos estudantes.
"Como compramos as máquinas nós mesmos, precisamos da receita para continuar oferecendo serviços de lavanderia aos nossos residentes a preços acessíveis", explicou um porta-voz da Duwo ao site holandês Folia.
A realidade enfrentada pelos estudantes universitários
A falta de acesso às máquinas modernas forçou os jovens a depender de apenas dez equipamentos analógicos disponíveis no local. Esses aparelhos antigos apresentam constantes problemas de funcionamento, frequentemente deixando apenas uma máquina operacional por vez. Essa situação obriga os estudantes a percorrer distâncias maiores, carregando sacos de roupas sujas até lavanderias comerciais na região de Darlingstraat.
O impacto vai além do simples inconveniente. Estudantes relataram ao jornal Folia preocupações genuínas sobre infestação de piolhos no prédio devido à impossibilidade de manter a higiene adequada das roupas e roupas de cama. Essa situação ilustra como problemas aparentemente técnicos podem rapidamente se transformar em questões de saúde pública.
Vulnerabilidades dos dispositivos inteligentes conectados
Este incidente expõe uma realidade preocupante sobre a segurança de dispositivos IoT (Internet das Coisas). Máquinas de lavar conectadas, assim como outros eletrodomésticos inteligentes, frequentemente operam com configurações de segurança inadequadas. Essas vulnerabilidades incluem senhas padrão fracas, falta de atualizações regulares de segurança e protocolos de comunicação inseguros.
Especialistas em cibersegurança alertam que dispositivos IoT podem servir como portas de entrada para invasões mais amplas. Denis Riviello, diretor de segurança da informação da empresa CG One, explica que "uma vez que a pessoa ganha acesso a uma câmera, por exemplo, vai ficar ali buscando uma brecha para conseguir entrar no computador e ter um ganho financeiro".
As vulnerabilidades em dispositivos IoT se manifestam principalmente através de:
Autenticação inadequada com senhas fracas
Baixo poder de processamento que limita recursos de segurança
Atualizações de firmware ausentes ou tardias
Configurações padrão inseguras mantidas pelos usuários
Transmissão de dados sem criptografia adequada
Ataques a instituições de ensino
Universidades têm se tornado alvos preferenciais de criminosos cibernéticos. A rede acadêmica brasileira Ipê, que conecta aproximadamente 1.800 instituições de pesquisa e ensino superior, registra cerca de 20 mil tentativas de ataques mensais. Esses números demonstram que o setor educacional enfrenta pressão constante de invasores.
No Brasil, casos similares já afetaram diversas instituições. A Universidade Metodista de São Paulo sofreu um ataque que prejudicou a emissão de diplomas e históricos escolares, impactando diretamente a vida profissional de estudantes. Um ex-aluno relatou ter "perdido oportunidades de emprego" devido à impossibilidade de comprovar sua formação acadêmica.
A Universidade Estácio de Sá também enfrentou problemas semelhantes, com sistemas fora do ar e cancelamento de provas online devido a suspeitas de sequestro de dados.
Impactos na vida cotidiana e lições aprendidas
O caso holandês serve como alerta sobre como ataques a dispositivos IoT podem transcender o mundo digital e causar transtornos reais na vida das pessoas. Diferentemente de invasões que visam dados financeiros ou informações confidenciais, este ataque afetou diretamente uma necessidade básica: a higiene pessoal.
A empresa de segurança Check Point identificou aumento de 41% nos ataques a dispositivos IoT, com escolas sendo vítimas preferenciais devido à abundância de dados pessoais disponíveis. Esses ataques frequentemente exploram a natureza interconectada dos dispositivos, usando um ponto de vulnerabilidade para afetar múltiplas vítimas simultaneamente.
Estratégias de proteção e prevenção
Para prevenir situações similares, especialistas recomendam diversas medidas de segurança:
Autenticação robusta: Implementação de senhas fortes e autenticação multifator em todos os dispositivos conectados.
Atualizações regulares: Manutenção constante do firmware e software dos equipamentos IoT.
Monitoramento de rede: Uso de sistemas de detecção de intrusões para identificar atividades suspeitas.
Criptografia adequada: Proteção na transmissão e armazenamento de dados sensíveis.
Configuração segura: Alteração de configurações padrão dos dispositivos antes da implementação.
O futuro da segurança em dispositivos conectados
Este incidente na Holanda representa apenas a ponta do iceberg de um problema crescente. À medida que mais dispositivos se conectam à internet, desde geladeiras até sistemas de iluminação, a superfície de ataque disponível para criminosos se expande significativamente.
A proliferação de dispositivos IoT vulneráveis pode levar a consequências ainda mais graves. Especialistas alertam para a possibilidade de "apagões digitais" causados por ataques coordenados a infraestruturas críticas. Rafael Narezzi, especialista em cibersegurança, destaca que "os riscos estão por todos os lados" em um ambiente cada vez mais conectado.
A situação dos estudantes holandeses permanece sem resolução definitiva. Enquanto aguardam uma solução da empresa Duwo, eles continuam enfrentando dificuldades para realizar uma tarefa tão básica quanto lavar roupas. Este caso demonstra que a segurança cibernética não é apenas uma preocupação técnica, mas uma questão que pode afetar profundamente aspectos fundamentais da vida cotidiana.
O ataque hacker a máquinas de lavar na Universidade de Amsterdã oferece uma lição valiosa sobre os riscos ocultos da conectividade digital. Enquanto dispositivos inteligentes prometem conveniência e eficiência, também introduzem novos vetores de vulnerabilidade que podem ser explorados de formas inesperadas.
Este incidente sublinha a necessidade urgente de investimento em segurança para dispositivos IoT, especialmente em instituições que atendem grandes populações. Mais importante ainda, demonstra que a cibersegurança deve ser considerada não apenas como proteção de dados, mas como salvaguarda de serviços essenciais que impactam diretamente o bem-estar das pessoas.
A experiência dos 1.250 estudantes holandeses serve como alerta: em um mundo cada vez mais conectado, a segurança digital se torna sinônimo de qualidade de vida. Negligenciar esse aspecto pode transformar a promessa da tecnologia inteligente em um pesadelo cotidiano muito real.
Fonte: The Register