Design
Comportamento
Garrafa feita para a praia
Designer japonês cria garrafa para praia que viraliza por formato polêmico
25/07/2025, 15:30
Quantas vezes você já se deparou com um produto que, mesmo criado com as melhores intenções, acaba gerando exatamente o oposto do que se esperava? Foi isso que aconteceu com uma criação do designer japonês Kenji Abe, que desenvolveu uma garrafa de cerveja especial para praias, mas que só ganhou os holofotes mundiais no meio de 2025 - e não pelos motivos que o criador imaginava.
A proposta era simples: facilitar a vida de quem gosta de apreciar uma cerveja gelada enquanto observa o mar. O problema? O formato escolhido despertou uma onda de interpretações que o designer certamente não previu.
O conceito por trás do projeto
A ideia nasceu de uma experiência comum a qualquer pessoa que já foi à praia: a dificuldade de encontrar uma superfície plana para apoiar a bebida. "Beber cerveja enquanto se observa o mar é especial", explicou Kenji Abe sobre sua criação. "Mas levar uma mesa até a areia é desafiador, por isso, essa garrafa permite aproveitar o mar, a areia e o céu azul com mais liberdade".
Apresentado na 2ª Conferência Internacional sobre Design para Ambientes Oceânicos em 2023, o projeto chamado "Ocean Blindness" apresenta uma garrafa de cerveja com base cônica arredondada, especificamente desenvolvida para ser fincada diretamente na areia. A forma lembra um torpedo, com o fundo pontiagudo substituindo a base plana tradicional.
O conceito é genuinamente funcional: eliminar a necessidade de mesa, e se mantém ereta quando inserida na areia, liberando as mãos do usuário e criando uma experiência mais integrada com o ambiente praiano.
A proposta sustentável que acompanha o design
Além da funcionalidade, o projeto de Kenji Abe carrega uma mensagem ambiental importante. Segundo o designer, após o uso, a garrafa poderia ser triturada e transformada novamente em areia, fechando um ciclo ecológico interessante.
Essa abordagem ecológica se alinha com práticas já existentes em várias partes do mundo. O vidro pode ser 100% reciclado e transformado em diversos materiais, incluindo areia para construção civil.
No Brasil, cooperativas já realizam esse tipo de trabalho, como a Coopbravo no Ceará, que transforma garrafas de vidro coletadas em praias em areia utilizada na construção civil.
A reciclagem de vidro oferece vantagens ambientais significativas: reduz a necessidade de extração de matérias-primas naturais como areia, calcário e soda cáustica; diminui o consumo de energia comparado à produção de vidro novo; e reduz a quantidade de resíduos enviados para aterros sanitários.



Imagens: kenjiabe.com
O que deveria ser prático virou piada global
Tudo mudou quando a conta "World of Engineering" no X (antigo Twitter) compartilhou imagens do projeto em julho de 2025. O que era para ser uma demonstração de design funcional rapidamente se transformou em algo completamente diferente.
O formato cônico da garrafa de cerveja despertou associações que o designer certamente não havia considerado. Usuários das redes sociais começaram a fazer piadas sobre a semelhança da garrafa com outros objetos, gerando comentários como "fincar na areia... sim, claro".
A reação foi imediata e global. Um médico de emergência chegou a alertar: "Olá, sou médico de pronto-socorro. Não sei quem precisa ouvir isso, mas nem pensem nisso".
O caso da garrafa ilustra como o design pode ser interpretado de formas completamente diferentes das intencionadas. Usuários diversos das redes sociais encontraram humor na situação, transformando uma discussão sobre funcionalidade em debates sobre interpretação visual.
Como observou um usuário: "Posso enfiar qualquer garrafa de cerveja na areia", questionando se a modificação no formato realmente era necessária. Outros levantaram preocupações legítimas sobre segurança, considerando os riscos de uma garrafa de vidro pontiaguda na areia.
A polêmica também revelou aspectos interessantes sobre como diferentes culturas interpretam formas e designs. O que para o designer japonês era uma solução prática, para o público internacional se tornou motivo de humor e debate sobre outras possíveis utilizações.
O designer responsável
Kenji Abe é um designer de produtos baseado em Tóquio, ativo desde 2013. Seu portfólio inclui trabalhos em diversas áreas, desde eletrônicos até itens de interior e artesanato. Com mais de 108 mil visualizações de projetos em plataformas como Behance, ele é reconhecido por seu trabalho em design industrial e participação em eventos de design.
O designer japonês deixou claro que sua criação da garrafa para praia é "puramente uma obra de arte conceitual e não é um produto comercialmente disponível".
Ele enfatizou que "não há planos para fabricá-la ou vendê-la" e que foi criada simplesmente "para inspirar um momento de reflexão sobre o mar".
O design japonês e suas características únicas
Para entender melhor o projeto de Kenji Abe, é importante considerar as características do design japonês. A estética japonesa tradicionalmente valoriza a imperfeição como parte da beleza natural, buscando a simplicidade através da eliminação do não essencial.
O minimalismo japonês não é apenas simplificação visual, mas uma síntese inteligente de múltiplos elementos, conseguindo "dizer muito em pouco" sem sobrecarregar o design. Essa abordagem se manifesta claramente na garrafa de cerveja de Kenji Abe, onde uma modificação aparentemente simples - o fundo cônico - resolve um problema prático complexo.
A cultura japonesa também tem uma relação única com a natureza e a funcionalidade, buscando criar objetos que se integrem harmoniosamente ao ambiente de uso. Isso explica tanto a proposta sustentável quanto o foco na experiência do usuário na praia.
Discussões sobre design
O projeto gerou discussões importantes sobre segurança, praticidade e responsabilidade no design. Alguns questionaram se uma garrafa de vidro pontiaguda na areia não criaria riscos desnecessários para outros usuários da praia.
Outros debateram a real necessidade da modificação, considerando que garrafas comuns podem ser parcialmente enterradas na areia para estabilização. Essas críticas, embora feitas com humor, tocam em questões fundamentais sobre design funcional vs. design conceitual.
A polêmica também destacou como objetos de design podem transcender sua função original e se tornar símbolos culturais, independentemente da intenção do criador. Neste caso, a garrafa de cerveja se tornou um símbolo involuntário de como interpretações podem fugir completamente do controle.
O futuro do design sustentável
O aspecto mais duradouro do projeto de Kenji Abe pode ser sua proposta sustentável. Em um momento onde a economia circular ganha cada vez mais importância, a ideia de produtos que retornam à natureza em forma utilizável representa uma direção promissora.
A moda praia sustentável, por exemplo, já utiliza materiais reciclados como garrafas PET e redes de pesca abandonadas para criar produtos funcionais e ecológicos. A abordagem de Kenji Abe de criar uma garrafa que pode se tornar areia após o uso se alinha com essas tendências.
Projetos de reciclagem de vidro em areia já mostram resultados positivos ao redor do mundo, demonstrando que a proposta não é apenas conceitual, mas tecnicamente viável. Cada quilograma de vidro reciclado pode produzir um quilograma de vidro novo, reduzindo significativamente as emissões de CO2 e a extração de matérias-primas.
Consequências imprevistas
A garrafa japonesa se tornou muito mais do que uma solução para beber na praia. Ela se transformou em um caso de estudo sobre interpretação, viralização e as complexidades do design contemporâneo.
O episódio nos lembra que, no mundo conectado atual, qualquer criação pode ganhar vida própria além das intenções de seu criador. Para designers, isso representa tanto um desafio quanto uma oportunidade: criar soluções funcionais que possam resistir a diferentes interpretações culturais, mantendo sempre o foco na sustentabilidade e na experiência do usuário.
A discussão gerada pela garrafa de Kenji Abe também demonstra como o design pode servir como catalisador para conversas mais amplas sobre cultura, interpretação e responsabilidade criativa. Independentemente das piadas, o projeto continua sendo um exemplo interessante de como repensar objetos cotidianos pode gerar soluções inovadoras - mesmo quando essas soluções acabam sendo interpretadas de formas completamente inesperadas.
Fonte: Dieline | Edge Media Network